Foto: Pivide Kumaru
Desde o dia 14 de janeiro de 2025, povos indígenas de diversas etnias e regiões do Pará ocupam a Secretaria de Educação do Estado (SEDUC) em protesto contra os impactos da Lei Nº 10.820/2024. Aprovada sem consulta prévia às comunidades, a legislação é vista como uma ameaça direta ao direito à educação escolar indígena diferenciada, essencial para a manutenção das culturas e línguas dos povos originários.

A lei também precariza as condições de trabalho dos professores que atuam em comunidades remotas, muitos dos quais precisam arcar com custos de transporte e estadia para conseguir dar aulas. Muitos desses professores são obrigados a arcar com os custos de transporte e estadia para conseguir dar aulas em comunidades remotas, tornando a permanência docente cada vez mais inviável. Além disso, o projeto do Centro de Mídias da Educação Paraense (CEMEP) tem sido amplamente criticado por tentar substituir professores por telas, implementando um modelo de ensino a distância em regiões onde nem sequer há eletricidade regular, aprofundando ainda mais a exclusão educacional. Em meio a esse cenário, o governo do Pará anunciou a compra de 1.650 kits da Starlink para conectar escolas estaduais, como parte do programa “Kit Bora Estudar”, lançado no dia 10 de fevereiro pelo governador Helder Barbalho (MDB). A medida, longe de resolver os problemas estruturais da educação indígena, reforça um modelo tecnocrático e excludente, ignorando a importância da presença de educadores e da valorização das metodologias tradicionais de ensino.

Em resposta à falta de diálogo do governo estadual e à recusa de atendimento por parte da SEDUC, o movimento indígena decidiu ocupar o segundo andar do prédio da Secretaria, às 7h30 do mesmo dia, com o objetivo de chamar atenção para a grave situação. A ocupação foi marcada por assembleias, reuniões estratégicas e rituais tradicionais, buscando reforçar sua legitimidade cultural e política. Contudo, o governo estadual não demonstrou qualquer intenção de dialogar.
Em uma tentativa de intimidar e desmobilizar o movimento legítimo , o governo do estado enviou a Tropa de Choque da Polícia Militar, que cercou o prédio, cortou a energia e a água e agiu com muita truculência usando spray de pimenta. Os manifestantes chamam atenção para a falta de consulta prévia às comunidades impactadas pela lei, o caráter autoritário na aprovação, que precariza o Sistema de Organização Modular de Ensino (SOME/SOMEI), que já enfrentava inúmeras dificuldades operacionais nas comunidades mais afastadas.

A situação escalou rapidamente para outras regiões do estado, com indígenas do Tapajós ocupando e fechando a Rodovia BR-163, em Santarém, ampliando o movimento que afeta a educação de todo o estado do Pará. A mobilização também ganhou força com o bloqueio de rodovias federais, como a BR-222, realizada pelos indígenas Gavião Parkatejê.

No dia 27, a Ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, visitou a ocupação indígena. Durante o encontro, que já durava 14 dias, a ministra dialogou com cerca de 300 indígenas de 20 povos. Após ouvir as demandas, Guajajara articulou uma reunião entre as lideranças indígenas e o governador Helder Barbalho, realizada no dia seguinte, 28 de janeiro, no Palácio do Governo. Apesar de quatro horas de discussão, não houve consenso entre as partes.

No dia 28, antes da reunião com o governador Helder Barbalho, os indígenas foram obrigados a entregar seus celulares, uma medida que impediu qualquer registro e escancarou a tentativa do governo de controlar a narrativa e silenciar denúncias. Esse ato não apenas viola o direito à comunicação, mas também reforça a postura autoritária do governo, que busca minar a mobilização indígena. A comunicação popular é uma ferramenta essencial para romper estereótipos e garantir que os próprios povos indígenas contam sua história.
A decisão de desocupação e os eventos relacionados têm repercutido em diversas mídias e são acompanhados com grande interesse por organizações sociais e movimentos indígenas, que reforçam a importância de uma política educacional que respeite as especificidades culturais e sociais dos povos indígenas.

O movimento reitera que, em um Estado Democrático de Direito, a luta por condições dignas de trabalho e educação é legítima e fundamental para a garantia dos direitos humanos. Os manifestantes indígenas exigem a exoneração do secretário de Educação do Estado, Rossieli Soares. Como resultado, a pressão para reverter esses retrocessos cresce, com o apoio crescente de organizações e grupos que entendem que a educação indígena é uma questão de justiça social e cultural.

A resistência dos povos indígenas do Pará na ocupação da SEDUC e nas rodovias é um exemplo de força coletiva e organização diante da tentativa de silenciamento. Apesar da repressão e da falta de diálogo por parte do governo, eles permanecem mobilizados, reivindicando não apenas a revogação da Lei 10.820, mas também o direito a uma educação que respeite suas culturas e territórios. Sua luta nos lembra que a defesa dos direitos indígenas é, acima de tudo, uma defesa da democracia e da diversidade que compõem o Brasil.